ICMS MAJORAÇÃO DE 1

ICMS majoração de 1%, aumento de alíquota de 17 para 18% - Lei 9.903/97 (de 1990 até 1997). A vinculação da receita (no caso 1%) desnatura o próprio conceito de imposto - Somente SP.
EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA ....ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE SÃO PAULO


Processo no.:
Ação:
Autor(es):


A RÉ, por sua obstante procuradora legal que esta subscreve, nos autos da ação acima identificada, vem respeitosamente à presença de V.Exa. nos termos dos artigos 188 e 300 do Código de Processo Civil, apresentar a sua CONTESTAÇÃO, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:

A presente ação foi proposta visando:

1. 1. Declaração da “inexistência de relação jurídica entre as partes, que obrigasse a autora ao recolhimento do I.C.M.S. com a majoração de 1% (um por cento), referente ao aumento da alíquota de 17% (dezessete por cento) para 18% (dezoito por cento)”;

2. 2. Condenação da ré à devolução dos valores pagos indevidamente, corrigidos monetariamente pela UFESP/IPC, inclusive os expurgos dos índices de correção monetária promovidos pelos planos governamentais e juros legais desde a data do seu efetivo desembolso, bem como juros compensatórios, facultando a compensação dos aludidos valores com as exações vincendas do ICMS;

3. 3. Declaração do direito da autora de se creditar extemporaneamente dos valores corrigidos.
Passaremos a analisar o pedido da autora, adiantando que, conforme se demonstrará, a ação não reúne condições de prosperar.
PRELIMINARMENTE

Ilegitimidade de Parte

Ademais, em casos de repetição de indébito, prevalece, sempre, o disposto no artigo 166 do Código Tributário Nacional que reza:

“Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.”

Essa previsão legal adequa-se perfeitamente ao ICMS que tem seu encargo financeiro integralmente transferido ao consumidor final.

Desta feita, para a repetição pretendida, ante os termos do retro referido artigo 166 do Código Tributário Nacional e também do artigo 333, I, do Código de Processo Civil, indispensável a prova, pelo autor, de ter arcado com o ônus do tributo ou de estar autorizado por quem arcou a recebê-la.


Pela natureza do imposto que ora se trata, os valores que o autor quer ver repetidos já foram repassados ao comprador, portanto, quem teria legitimidade para pleitear a devolução dessas quantias seria quem adquiriu os produtos comercializados pela empresa requerente, o chamado consumidor final.

Aliás, é até de se presumir que o autor repasse o valor do imposto ao consumidor final, considerando-se a natureza indireta do ICMS e visto que toda atividade econômica que visa ao lucro tem por princípio a inclusão de todos os custos no valor da mercadoria, mantendo-se ainda uma margem de proveito.

Disso resulta a impossibilidade de se obter o dito creditamento, por absoluta incompatibilidade com o art. 166 do CTN.

Esse entendimento, aliás, já foi acolhido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em sede de embargos de divergência, cujos argumentos principais estão abaixo reproduzidos:
“Tributário. ICM. Creditamento a posteriori. Repercussão. Prova.

O creditamento a posteriori equivale a efetiva repetição de indébito. Se o contribuinte já fez repercutir o tributo, transferindo a terceiros o respectivo encargo, não há mais como reconhecer-lhe direito ao creditamento, sem ofender o art. 166 do CTN.
Para que se efetive o creditamento a posteriori é necessária a prova de que o encargo do imposto respectivo não se transferiu ao contribuinte de fato.
.....................................................................................................

Em outras palavras, a embargante quer uma declaração no sentido de que é credora de ICM, em operações já consumadas. Semelhante creditamento, para efeitos práticos, equivaleria a efetiva repetição de indébito. Eis que o Estado, reconhecendo que recebeu tributo de quem não era devedor, não lhe devolve numerário, mas permite que este escriture um crédito em seu favor, para oportuna compensação com dívidas futuras. Assim, o reconhecimento do crédito resultará em compensação - modo mais cômodo e efetivo de satisfazer créditos.
Na hipótese, efetuada a compensação, o contribuinte terá recebido de volta aquilo que, a seu sentir, pagou indevidamente.

Não há dúvida, portanto: creditamento fiscal equivale a compensação.

Compensação, a seu turno, é uma forma de repetição do indébito. Ora, se o contribuinte fez repercutir o tributo, transferindo a terceiro o respectivo encargo, não há como reconhecer-lhe direito ao creditamento, sem ofender ao princípio consagrado no art. 166 do Código Tributário Nacional”.

(Embargos de Divergência no REsp n.º 4.156-0 - 1ª Seção - v.m. - Rel. Min. Gomes de Barros - j. 8.6.93 - DJU 18.10.93).

Também é dessa opinião o festejado ALIOMAR BALEEIRO:
“No art. 166, o CTN dá solução racional a velho problema, que já ocupou e dividiu muito as opiniões em nossos Tribunais, inclusive no S.T.F.

Este acabou por entender que todos os impostos chamados “indiretos” comportam sempre a repercussão do ônus econômico do contribuinte de jure para o contribuinte de fato. O vendedor tributado acresceria o tributo ao preço e o recobraria dos compradores sucessivos. Desse entendimento proveio a Súmula nº 71 daquela Corte: “-

Embora paga indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto.”(Hoje, esclarecida pela Súmula nº 546.)
O CTN, consciente da dificuldade de caracterizar-se o imposto indireto em certos casos e, também, de que a repercussão, embora provável nos impostos de produtos industrializados, I.C.M. e outros que assentam nas trocas econômicas, inclusive a compra e venda, afastou-se da Súmula 71 e admitiu a restituição se o interessado provar ter assumido o encargo, sem transferência para outrem, ou, tendo realizado tal transferência, se por este for autorizado a recebê-lo.” (in “DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO”, editora Forense, Rio de Janeiro, 1996, 10ª edição, pág. 565).

A propósito, nesse sentido também a lição de CARLOS VALDER DO NASCIMENTO, na obra “Comentários ao Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25.10.1966”, editora Forense, Rio de Janeiro, 1996, 2a edição, pág.441:
“Trata-se de tributos indiretos, que recaem sobre o consumidor final, expresso no preço das mercadorias.

Configura, portanto, tal comportamento relativo à transferência desse encargo financeiro, matéria de natureza econômica, que dá origem ao chamado fenômeno da repercussão, surgindo daí o contribuinte de jure e o contribuinte de fato.

O contribuinte de jure é o responsável pelo recolhimento da Fazenda Pública. O contribuinte de fato, segundo Gaze Assen Tufaile, “é o consumidor final que suporta o ônus e a quem o contribuinte de jure transfere o encargo, expressa ou implicitamente, na composição do preço da mercadoria”.
(...)

Os Tribunais têm decidido com pertinência ao tributo indireto, que a sua restituição somente se operará quando comprovado, pelo sujeito passivo, que não transferiu o ônus respectivo ao comprador dos bens. Essa é a posição da 2ª Turma do STJ.”
Assim, o autor deveria, de qualquer modo, provar o preenchimento de uma das condições impostas pelo artigo 166 do Código Tributário Nacional, o que não se verifica no caso.

Dito de outro modo, para que vingue a ação de repetição prevista nos arts. 165 e ss. do Código Tributário Nacional, não basta tão somente ter sido pago tributo cuja cobrança foi considerada inconstitucional.

Outrossim, mostra-se imprescindível – a exemplo, aliás, do que ocorre no campo do direito privado -, que tenha havido efetivo e demonstrado empobrecimento do solvens, com real e comprovado impacto sobre sua capacidade contributiva. Esse é o fundamento ético e jurídico da ação de repetição de indébito. Não é suficiente para legitimar essa ação o mero enriquecimento ilícito do ente público, mas o empobrecimento do contribuinte.

Ora, essa situação – que corresponde ao que ordinariamente acontece com os tributos pagos fora da atividade empresarial, por pessoas que o suportam e constituem o último elo de uma corrente – não se verifica habitualmente, como é notório, com os tributos pagos por empresas – como a autora -, que, justificadamente – embora em limites nem sempre razoáveis -, de ordinário embutem no preço de seus produtos e serviços – na maior extensão em que isto se mostre possível – a carga tributária que lhe onera a atividade.

Pois bem, no caso por último assinalado, em que os tributos se repassam integralmente a terceiros, o pagamento do tributo não acarreta, para o solvens, como é óbvio, qualquer diminuição patrimonial.

Deferir a repetição em tais hipóteses ensejaria, portanto, para o contribuinte, como parece desnecessário demonstrar com maior desenvolvimento um enriquecimento: a perda sofrida pelo pagamento do imposto foi ”compensada” pelo repasse do tributo a terceiros; reaver (o solvens) o que pagou constituiria, para ele, causa imotivada de acréscimo no patrimônio.

Em tema de repetição de indébito cumpre ter presente a precisa lição do eminente Min. VICTOR NUNES LEAL, que declarava que, diante do dilema irredutível entre enriquecer-se sem causa a Fazenda, com a não-devolução do tributo indevidamente cobrado, e enriquecer-se sem causa o contribuinte, que não tivesse suportado, com a tributação ilegítima, qualquer diminuição em seu patrimônio, ser sempre preferível optar-se pelo enriquecimento do

Estado, já que a atuação deste tem por fim a satisfação de interesses da coletividade, e constitui, portanto, dos males o menor:

“ Seria menos justo proporcionar-lhe (ao contribuinte de direito) um sobrelucro sem causa, para seu proveito pessoal, do que deixar esse valor em poder do Estado, que presumivelmente já o terá aplicado na manutenção dos serviços públicos e na satisfação dos encargos diversos que oneram o tesouro em benefício da coletividade.

Se o dilema é sancionar um enriquecimento sem causa, quer a favor do Estado, com a carência ou improcedência da ação, quer a favor do contribuinte, se for julgado procedente o pedido, não há que hesitar: impõe-se a primeira alternativa, pois o Estado representa, por definição, o interesse coletivo, a cuja promoção se destina, no conjunto da receita pública, a importância reclamada pelo particular para sua fruição pessoal. Esta solução é a que corresponde à equidade, fundamento básico da ação proposta.” (trecho do voto proferido no julgamento do R.E. n. 46.450, apud RICARDO LOBO TORRES, Restituição dos Tributos, Rio de Janeiro, Forense, 1983, p.18).

A exigência de alegação e comprovação da não-transferência nos casos em que a repercussão normalmente se verifica encontra amparo no citado artigo 166 do CTN e no entendimento expresso do verbete n. 546 da Súmula do Supremo Tribunal Federal:

“Cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de fato o quantum respectivo.”

De outro lado, contra a exigência da alegação e prova da não transferência, como no caso destes autos, não se dirá com proveito que termina por colocar sobre os ombros do contribuinte o encargo de provar fato negativo, e que esbarraria, por isso, na máxima segundo a qual negativa non sunt probanda.

O princípio segundo o qual os fatos negativos não comportam prova, além de não encontrar qualquer amparo no direito positivo, é, na verdade, do ponto de vista lógico, falso.
Consigne-se que toda proposição negativa pode, em regra, ser convertida em afirmação e vice-versa.

É lição perfeitamente aplicável à hipótese cogitada nestes autos: somente à custa de uma incompreensível obstinação persistir-se-ia no sofisma de recusar que, ao atribuir-se ao contribuinte o ônus de provar que não transferiu o tributo – fato negativo -, nada lhe está sendo exigido senão o cumprimento do encargo legal de demonstrar que o suportou, fazendo-o incidir sobre o seu lucro, e não sobre o custo que cobrou dos consumidores dos bens e serviços – o que constitui fato positivo, perfeitamente comprovável.

A inconsistência da objeção pode ser visualizada de outro ângulo. Sequer os mais fervorosos adeptos da idéia de que o ICMS deve ser incondicionalmente repetido poderiam negar, sem fazer tábula rasa de entendimento firmemente estabelecido na jurisprudência, que, nos mal denominados tributos indiretos, a repetição exige prova da não-transferência do imposto. Ora, a prova que o ESTADO DE SÃO PAULO está exigindo para a eventual repetição do ICMS é exatamente a mesma que correntiamente se considera possível em outros casos. Não se pode considerar a mesma prova ali admissível e aqui incabível, sem grave atentado à lógica.

A conclusão é que: tendo sido o ICMS pago por pessoa jurídica, tal como a autora, contra a qual pesa a presunção de que transferiu o tributo, a repetição não pode dar-se em ação proposta para esse fim, a menos que se prove o empobrecimento do solvens, isto é, que o valor correspondente ao imposto incidiu sobre seu lucro, não tendo sido repassado aos preços dos produtos e dos serviços que produz, ou presta, e cobra por eles.

Não feita a prova de plano – como não o foi – o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito. Isto em função dos princípios da equidade e da vedação de enriquecimento sem causa (vide art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil – Decreto-Lei n. 4.657/42).

Nesse sentido, a jurisprudência do Colendo Supremo Tribunal Federal. Confira-se trecho do acórdão proferido no Recurso Extraordinário n. 96.054-RJ:

“Para a repetitio indebiti não basta ser contribuinte de iure e comprovar o recolhimento indevido. O que dá foros de legitimidade à repetitio, é o enriquecimento de alguém com o injusto prejuízo de outrem; enriquecimento sem causa legítima. E o que exprime a injustiça do enriquecimento é, precisamente, o desfalque que aflige ao patrimônio alheio, o imerecido empobrecimento de um em proveito de outro.
“...não pode o particular pretender repetir somas que efetivamente, não recolheu, ou que recolhem (sic), mas não desembolsou. Se não sofreu prejuízo algum(...), não faz juz (sic) a desembolso. Sem prejuízo não há base legítima para restituição, salvo se quem desembolsou autoriza o recebimento (CTN, art.166)”(RTJ 112/283).

A propósito, entender que a autora está legitimada para a causa é condescender, vergonhosamente, com seu enriquecimento injusto, não se devendo olvidar o fato de que os verdadeiros legitimados para a causa são os clientes da autora, os quais efetivamente suportaram o ônus tributário em tela. Em sendo assim, se os clientes da autora, porventura vierem a juízo pedir a repetição do apontado indébito, o ESTADO DE SÃO PAULO arcará com DUPLA RESTITUIÇÃO. Isto porque terá de desembolsar DUAS vezes quantia que ingressou ao Erário apenas UMA vez; em uma devolução à autora, que se locupletará indevidamente, outra em devolução ao contribuinte de fato, verdadeiro legitimado para a devolução.

Destarte, impõe-se, por dever ético e jurídico, a extinção do processo sem julgamento do mérito, com base no art. 267, VI, do Código de Processo Civil.

Falta de Interesse de Agir

Ainda por outro motivo o feito deve ser julgado extinto sem julgamento do mérito.
Explica-se.
Prescreve o art. 3º do Código de Processo Civil o seguinte: “Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade” (grifou-se).

Segundo a lição de ANTÔNIO CARLOS DE ARAÚJO CINTRA, ADA PELLEGRINI GRINOVER e CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, o interesse de agir – que, como se sabe, é uma das condições da ação – assenta-se na premissa de que, muito embora o Estado seja interessado no exercício da jurisdição (função imprescindível à manutenção da paz e da ordem social), “não lhe convém acionar o aparato judiciário sem que dessa atividade se possa extrair algum resultado útil” (Teoria Geral do Processo, 11ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 1995, página 258) (grifou-se). Por isso, é mister que “em cada caso concreto, a prestação jurisdicional solicitada seja necessária e adequada” (idem, ibidem) (grifou-se).

A necessidade da tutela jurisdicional – prelecionam os renomados mestres – repousa na “impossibilidade de obter a satisfação do alegado direito sem a intercessão do Estado – ou porque a parte contrária se nega a satisfazê-lo, sendo vedado ao autor o uso da autotutela, ou porque a própria lei exige que determinados direitos só possam ser exercidos mediante prévia declaração judicial...” (idem, ibidem). Ou seja, há necessidade quando, somente através do processo, a parte consegue obter a tutela do seu direito (HUMBERTO TEODORO JÚNIOR, Curso de Direito Processual Civil, Volume II, 8ª edição, São Paulo, Forense, 1995, página 400).

Já a adequação diz respeito com idoneidade do provimento jurisdicional pleiteado (VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 1º volume, 9a. edição, São Paulo, Saraiva, 1994, página 81), com a “utilidade que o pronunciamento pretendido venha a proporcionar ao autor, no sentido de lhe resolver o conflito de interesses”(E.D.MONIZ ARAGÃO, Comentários ao Código de Processo Civil, volume II, 8a. edição, São Paulo, Forense, página 400).

Ora, no caso concreto, não se antevê a adequação, pois o provimento jurisdicional solicitado afigura-se totalmente inútil.

De fato, porque em nada aproveita a ela a declaração da inexistência de relação jurídico-tributária pretérita, ocorrida entre 01 de janeiro de 1990 e 31 de dezembro de 1997.

A situação é clara: a ação declaratória prevista no artigo 4º do Código de processo Civil, tem efeitos ex nunc; jamais ex tunc, porque senão, converter-se-ia em ação desconstitutiva.

Destarte, se a autora já recolheu o ICMS majorado em 1 (um) ponto percentual, tal como determinava a Lei Estadual n. 6.556/89 – revogada pela Lei Estadual n. 9.903, de 30 de dezembro de 1997 -, não há que se falar de declaração de inexistência de relação jurídico-tributária. Entre 01 de janeiro de 1990 e 31 de dezembro de 1997, mas sim, em desconstituição, em repetição de eventual indébito! Falar-se em declaração de inexistência de relação jurídica pretérita é, pois, um absurdo jurídico!

Como a autora em março de 2012 – DEPOIS DE EDITADA A LEI ESTADUAL N. 9.903, QUE MAJOROU A ALÍQUOTA DO ICMS E REVOGOU TODAS AS LEIS QUE DISPUNHAM EM SENTIDO CONTRÁRIO-, ajuizou ação visando obter provimento jurisdicional declaratório da inexistência de relação jurídica ocorrida à luz de legislação revogada, impõe-se a decretação da extinção do processo sem julgamento do mérito, na forma do art. 267, VI, do Código de Processo Civil, dada a flagrante falta de interesse de agir.

Não bastassem essas ponderosas razões, a admissão do provimento declaratório pretendido pela postulante importaria em conferir ultratividade à Lei Estadual n. 6.556/89, o que constituiria um vistoso tentado à letra e ao sentido da norma jurídica inscrita no art. 2º, par.1º, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei n. 4.657/42), que dispõe o seguinte: “A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

É o caso dos autos, pois, como já dito, a mencionada Lei Estadual n. 9.903/97 revogou tanto a Lei n. 6.556/89 quanto aquelas que lhe sucederam (e que supostamente, teriam infringido o princípio da não afetação, previsto no art. 167, IV, da Constituição Federal), ao regular inteiramente a majoração de alíquota do ICMS.

Conseqüentemente, a partir de 01 de janeiro de 1998, a lei que rege a hipótese vertente nos autos é única e exclusivamente a Lei n.º 9.903, publicada em 31/12/97 e não aquelas a que se refere a autora.

Em sendo assim, não há que se falar de declaração de inexistência de relação jurídica à luz de legislação revogada, lembrando-se que a autora ajuizou a presente ação em março de 2012, depois, portanto, da vigência da Lei Estadual n. 9.903/97.

Assim, impõe-se a decretação da extinção do processo sem julgamento do mérito, na forma do art. 267, VI, do Código de Processo Civil, dada a flagrante falta de interesse de agir quanto ao pedido declaratório de inexistência de relação jurídico tributária.

Ademais, referido diploma elevou a alíquota do ICMS para o ano de 1998 de 17% para 18% sem a indigitada vinculação de receita que constitui a causa de pedir da ação.

Isto faz com que o pedido de devolução das quantias que se venceram após a edição da Lei mencionada seja desprovido de fundamento. A conclusão é pela impossibilidade de devolver qualquer quantia recolhida após 31 de dezembro de 1997.

Deverá, portanto, a ação, quanto ao período posterior à vigência da norma referida, ser julgada extinta sem julgamento de mérito na forma do art. 267, VI, do Código de Processo Civil, dada a flagrante ausência de causa de pedir.

NO MÉRITO

Prescrição

Como a ação foi proposta em março de 2012, estão prescritos os valores anteriores a março de 1994.
Com efeito, reza o Decreto n.º 20.910 de 06 de janeiro de 1932, em seu artigo 1º:

“Art. 1º. As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originaram.”

Tal regra conjugada com a regra do artigo 219, parágrafo 1º do Código de Processo Civil induz à inafastável conclusão de que ocorreu prescrição quanto aos valores anteriores a março de 1994.

A prescrição é de ser decretada.

Legalidade do Aumento de Alíquota Determinado Pelas Leis Aprovadas de 1990 em Diante, para Viger nos Exercícios de 1991 a 1997

O contribuinte aforou a presente ação denominando-a declaratória e formulando pedido consistente na declaração da “inexistência de relação jurídica entre as partes, que obrigasse a autora ao recolhimento do I.C.M.S. com a majoração de 1% (um por cento), referente ao aumento da alíquota de 17% (dezessete por cento) para 18% (dezoito por cento)”, instituída pela Lei 6.656/89, prorrogada atualmente pela Lei n0 9.464 até 31.12.97.

A Autora sustenta que o aumento da alíquota teria incidido no óbice constitucional da vinculação de receita tributária, sustentação que, à primeira vista, pode impressionar, em decorrência do fato, já notório, do Supremo Tribunal Federal ter declarado, incidentalmente, a inconstitucionalidade de vários artigos da Lei paulista n.0 6.556/89, em relação a qual o debate, aqui, está prejudicado, ante a indiscutível ocorrência da prescrição, reconhecida pela decisão monocrática.

O ponto relevante a sublinhar, quanto ao mérito, é que existe diferença marcante, fundamental, essencial, entre a lei estadual n.0 6.656/89 e as que lhe sucederam.

Cumpre, pois, analisar o julgamento prolatado pelo STF e, principalmente, a diferença basilar entre a lei de 1989 e aquelas promulgadas nos anos seguintes.

O voto condutor desse julgamento (RE 183.906-6/SP) evocou precedente, do próprio STF (RE 97.718), sendo oportuna a transcrição:

"O nobre Ministro-Relator ficou vencido, no que entendeu que mesmo declarada a inconstitucionalidade do preceito, o acréscimo subsistiria, faltando o interesse de agir da então Recorrente. Prevaleceu voto divergente, proferido pelo Ministro Moreira Alves, do seguinte teor:
'Senhor Presidente, embora reconheça a validade dos argumentos do eminente relator, data venia, entendo que, no caso, há interesse. A meu ver, desde que o acréscimo seja criado em lei com destinação específica, que é inconstitucional, a destinação específica contamina o próprio acréscimo. Não há que se dizer que este acréscimo, tendo natureza moratóría, destina-se a atender ao ressarcimento do prejuízo pela mora ao Estado. Em realidade, o Estado criou este acréscimo para atender a uma finalidade que é vedada pela Constituição. Assim, no meu entender, se a finalidade é inconstitucional, o acréscimo criado para atender a esta finalidade também o será."' (g.n.)

Como se vê, o motivo da declaração incidental de inconstitucionalidade da Lei 6.656/89 foi o entendimento do STF de que ela própria previu a destinação específica da receita gerada pelo acréscimo, incidindo na proibição constitucional â vinculação da receita.

Esta conclusão não pode, à toda evidência, ser estendida para as leis subseqüentes.

A diferença essencial entre a Lei 6.656/89 e as demais reside no fato de que no ano de 1989 não foi editada Lei de Diretrizes Orçamentárias que previsse a majoração da alíquota (aplicável no exercício de 1990) e o destino da respectiva receita. Diferentemente, do ano de 1990 em diante, as respectivas Leis de Diretrizes disciplinaram a questão, prevendo, sempre, a majoração da alíquota (que seria instituída por leis ordinárias editadas posteriormente) e a destinação da receita no exercício seguinte.

Ou seja, a Lei n.0 6.556/89 foi considerada inconstitucional por ter previsto, ela própria, a destinação da receita, que contaminou o aumento da alíquota. As outras leis, ao contrário, não o fizeram, porque essa destinação já fora prevista anteriormente pelo diploma adequado, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, preservando incólume a elevação da alíquota interna.

Uma das inovações introduzidas pela Constituição de 1998, em relação à Carta de 67/69, foi a inserção da figura da Lei de Diretrizes Orçamentarias. Ao fazê-lo, o constituinte elencou as funções do novel diploma legal, dentre as quais nos interessa, neste recurso, a norma do artigo 165, parágrafo 20, in verbis:

"Par. 20 - A lei de diretrizes orçamentárias compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento."

Como se vê, à lei de diretrizes foi incumbido dispor sobre as alterações na legislação tributária, bem como fixar as metas e prioridades da Administração, informando e orientando a elaboração da Lei Orçamentária anual, o que evidentemente compreende o destino reservado às receitas auferidas pelo ente público.

No ano de 1989, tais mandamentos não foram observados no Estado de São Paulo. À mingua desse "cuidado", que evidentemente não pode ser mobilizado na defesa fazendária, o STF considerou que a indigitada Lei 6.556/89, que em seu artigo 40 arvorou-se justamente a "estabelecer diretriz a ser executada durante a execução orçamentária", foi a responsável pela vinculação da receita derivada do aumento de alíquota, incidindo na proibição constitucional.

O quadro é completamente distinto quanto às leis supervenientes, na medida em que as Leis de Diretrizes, aprovadas no meio do ano e sempre muito antes das leis ordinárias determinantes do aumento de alíquota, invariavelmente dispuseram sobre a alteração tributária e sobre o destino que se pretendia dar às respectivas receitas.

Isto significa que, ano após ano, averiguando permanentemente a situação das finanças públicas, o Parlamento estadual, ao deliberar sobre a destinação de todas as receitas públicas, estabeleceu, como meta orçamentária, no diploma adequado - a Lei de Diretrizes - que a receita a ser utilizada na construção de moradias populares não poderia ser menor do que o acréscimo gerado pelo aumento das alíquotas.

Logo, não se pode inquinar às leis ordinárias aprovadas de 1990 em diante a vinculação de receitas que fulminou a lei 6.656/89.

Tomando como exemplo a Lei de Diretrizes Orçamentarias promulgada em 1991, cujas projeções dizem respeito ao exercício de 1992, verifica-se a perfeita observância dos comandos constitucionais, como emerge da leitura de seu artigo 29, inciso IV:

"Art. 29 - O Poder executivo enviará á Assembléia Legislativa projetos de lei dispondo sobre alterações na legislação tributária, especialmente sobre:

IV - Prorrogação da vigência da Lei n.0 7.003, de 27 de dezembro de 1990, que elevou a alíquota do ICMS prevista no artigo 34, 1, da Lei n.0 6.374/89, de 1º de março de 1989, a fim de propiciar recursos adicionais para programas de habitações populares, destinados a beneficiar populações de baixa renda."
Idêntica disposição já havia sido observada em 1990 (art. 29, IV, da Lei n.0 6.958/90) e foi repetida nas Leis de Diretrizes aprovadas nos anos de 1992 (art. 26, IV, da Lei 7949/92), 1993 (art. 28, IV, da lei 8359/93) e subsequentes.

Portanto, a previsão sobre o aumento da alíquota e, mais, a previsão sobre a destinação da respectiva receita foi prevista, sempre - exceção feita ao ano de 1989 - na Lei de Diretrizes Orçamentárias que aprovou os critérios de aplicação da receita a observar no ano seguinte.