HC FALSIFI. SELO SINAL PUB.
DEFENSORIA PÚBLICA GERAL DO ESTADO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR VICE PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
REF: PROC. 6.54000 - 3000ª VC
ART. 180 E 20006 § 1º N/F
DO ART. 6000, CP.
CÉSAR TEIXEIRA DIAS, Defensor Público, titular do Órgão de Atuação da Defensoria Pública junto ao Juízo de Direito da 3000a Vara Criminal da Comarca da Capital, vem, no uso de suas atribuições e na forma da legislação em vigor, impetrar uma ordem de
H A B E A S C O R P U S
em favor de CARLOS JAIME MARQUES, brasileiro, solteiro, pedreiro, RG 4.003.10004, filho de Regina Edna Marques, residente na Rua do Xixoro, 16 - Catumbi, nesta cidade, contra coação ilegal da MERITÍSSIMA JUÍZA DE DIREITO DA 3000a VARA CRIMINAL, aduzindo o seguinte:
- DO PROCESSO EM PRIMEIRO GRAU
O paciente foi preso em flagrante em 26 de outubro de 10000005, estando recolhido na carceragem da 1000a DP, por suposta incidência comportamental nas normas dos artigos 180 caput e 20006, § 1o, inc. I, na forma do art. 6000, todos do Código Penal.
A denúncia em face do paciente foi recebida em 16 de novembro de 10000005,sendo o mesmo interrogado em 12 de dezembro, (CÓPIA DA DENÚNCIA EM ANEXO - DOC. 1).
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Verificando a heresia jurídica que se formava desde a exordial (DOC. 1) em detrimento de princípios e direitos básicos garantidos em sede constitucional, a Defesa interpôs o modesto petitório de fls. 4000/50, instruido com os documentos de fls. 51/60, onde requereu, alternativamente, fosse afastada, ab initio, a imputação de “violação ou inutilização de selo ou sinal”, o que permitiria o arbitramento da fiança em face do delito remanescente, qual seja, o de receptação, bem como foi requerida a concessão de liberdade provisória à luz do parágrafo único do, art. 310, do CPP (DOCUMENTOS ANEXOS 2/12).
Em apaixonado arrazoado, Sua Excelência, a Doutora Promotora de Justiça, insurgiu-se contra o pleito defensivo, censurando com aspereza os argumentos que o embasaram (DOC. 13), argumentando, em síntese, que a Defesa pretendia antecipar a discussão do mérito, o que só teria lugar por ocasião das alegações finais.
Ao verso de fls. 85 dos autos (DOC. 14), a Ilustre Magistrada a quo, ora apontada como autoridade coatora, entendendo pela existência dos pressupostos ensejadores da prisão preventiva, indeferiu o requerimento da Defesa, havendo por provada a materialidade, bem como a necessidade da mantença da medida cautelar pela garantia da ordem pública e segurança da futura aplicação da lei penal.
Este o breve escorço do processado que originou o presente Habeas Corpus.
- DA IMPROPRIEDADE DA PEÇA VESTIBULAR
Evidentemente laborou em equívoco o Ilustre Órgão Ministerial ao denunciar o paciente, isto no que se refere ao enquadramento da contuda no art. 20006 do Código Penal.
Com efeito, o Ministério Público, por sua Promotora de Justiça, através de mirabolante ginástica intelectual, acabou por transformar um simples “indiferente penal” em um delito.
O Código Penal, em seu artigo 20006, § 1o, inciso I prevê - ipsis verbis:
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“FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO
ART. 20006. FALSIFICAR, FABRICANDO-OS OU ALTERANDO-OS.
§ 1o. INCORRE NAS MESMAS PENAS:
I - QUEM FAZ USO DO SELO OU SINAL FALSIFICADO.”
Como cediço, o tipo acima é taxativo e restringe-se apenas às condutas de falsificar, fabricar ou alterar selos ou sinais públicos, não admitindo, ex vi do Princípio da Reserva Legal, interpretação extensiva ou analógica.
No caso em tela, imputa-se ao paciente a conduta típica de “fazer uso do selo ou sinal falsificado”, prevista no § 1o, inc. I, do mesmo artigo.
Tal imputação, como é lógico, tem como conditio sine qua nom a existência de um selo ou sinal falsificado para que, uma vez usado, aí sim, se materiliza a violação da norma. Caso contrário, se não houver um selo ou sinal falsificado, jamais se poderá cogitar do aludido tipo.
IN CASU, a persecução criminal, desde a fase inquisitiva, está a demonstrar que o selo pretensamente violado, não foi falsificado ou adulterado, mas simplesmente trocado por um outro, também imaculado, pertencente, porém, a outro veículo.
QUESTÃO TORMENTOSA É SABER-SE COMO PODE ALGUÉM SUPORTAR A IMPUTAÇÃO DE UM DELITO DE USO DE SELO FALSIFICADO, QUANDO, À TODA EVIDÊNCIA, DITO SELO SEQUER FOI ADULTERADO ? (É UM CONTRA-SENSO).
Como se não bastasse, é de se apontar, ainda, a discrepância entre a narrativa de fls. 02 e a capitulação feita às mesmas fls.. (DOC. 1)
O que exsurge daquelas fls. é que, enquanto o corpo da denúncia fala em “violação ou inutilização de selo ou sinal”, que teria consistido na “retirada das placas originais e colocação das placas ‘frias’”, a capitulação inicial faz remissão aos art. 20006, § 1o, inc. I, que cuida de “uso de selo ou sinal falsificado”, o que é bem diferente.
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Apenas do que até aqui exposto, observa-se que a acusação foi feita de forma imprecisa, genérica e confusa, o que poderá, se mantida, trazer danos irreparáveis ao paciente.
Repise-se que este intróito tem o mister de esclarecer que não se pretende antecipar a discussão de mérito, mas tão somente, mostrar a essa Corte o quão é incabível a imputação do art. 20006, do Código Penal, que, ainda que viável, estaria absorvida pelo delito de receptação, em face do consagrado PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO.
Malgrado inexistir na legislação pátria dispositivo que permita ao Julgador a extirpação da ação penal quando desde logo se tenha como certo o seu insucesso, como é o presente caso, temos, por analogia, guardada as devidas proporções, que a regra ínsita no art. 310 do Código de Processo Penal autoriza fazê-lo.
Do texto do art. 310, do CPP infere-se que o Magistrado pode, apenas quando vislumbre qualquer das causas de justificação ou eximentes de pena, conceder a liberdade. E ISTO ANALISANDO APENAS O INQUÉRITO POLICIAL.
Soa-nos como uma equação matemática o reciocínio construído sobre o referido dispositivo.
Ora, uma vez que o Juiz pode, de antemão, apreciar uma causa excludente da ilicitude ou da culpabilidade para conceder a liberdade ao acusado, com muito maior razão, e poderá fazê-lo, quando verifique que o fato tido como criminoso sequer foi cometido. Ou, quando muito, foi cometido mas é um indiferente penal.
Tivesse feito o Magistrado a quo um estudo mais detido da denúncia antes de recebê-la, como, data venia, seria o mais recomendável, isto tudo teria sido evitado e não se estaria ocupando o tempo e a gravidade do Segundo Grau de Jurisdição com o presente caso, a priori, facilmente resolúvel pelas vias ordinárias no Primeiro Grau.
Nada obstante, quer parecer ao impetrante que o mais indicado seria, em razão da inépcia, o indeferimento da denúncia, para que uma outra, melhor elaborada, fosse oferecida.
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Mas, em tendo a mesma sido recebida, não se nos afigura como acertada a posição do Juiz de 1º Grau em manter a segregação do paciente, quer ante a inviabilidade do pretenso crime de “uso de selo falsificado”, que se afastado tornaria cabível o arbitramento da fiança para o crime de receptação, quer pela regra do art. 310, parágrafo único do CPP, conforme o anterior requerimento.
- DA FALTA DE JUSTA CAUSA ENSEJADORA DO
MANDAMUS, NO TOCANTE AO DELITO DO ART.
20006, DO CÓDIGO PENAL.
É certo que nas vias estreitíssimas do remédio heróico não há falar-se em meritum causae.
Há vezes, todavia, em que o exame do concerto probatório, ainda que perfunctório, é necessário para dar-se valia às garantias constitucionais do acusado, mesmo em sede de Hábeas Corpus.
Já é pacífico nos Tribunais de nosso Estado, que o mandamus é remédio idôneo para fazer cessar constrangimento ilegal que consista em falta de justa causa para a deflagração da ação penal, inclusive com aplicaação extensiva aos inquéritos policiais.
Contudo, não é o presente para pretender o trancamento total da ação penal que já foi instaurada contra o paciente. O que se visa com a concessão do writ a prol do paciente, é evitar que este seja sujeito passivo de uma ação penal que ultrapasse em muito os limites traçados pela Lei.
Pretendesse o impetrante a interrupção de toda a persecutio criminis, teríamos, de sobejo, material jurisprudencial para embasar no pleito.
Ocorre, porém, que o caso em estudo não urge com relação a toda a ação penal, mas sim exclusivamente na parte que toca ao delito do art. 20006 do Código Penal.
DESTA FORMA, como o propósito é somente estancar a parte da imputação que respeita ao delito de uso de selo falsificado, roga o impetrante a essa Corte que conceda a ordem para trancar a ação penal em curso no 1o Grau, apenas no que concerne ao crime do art. 20006, § 1o, inc. I, do Código Penal.
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Cumpre esclarecer, contudo, que é também objetivo do impetrante ver concedida a liberdade provisória ao paciente. Em face disto, prossegue a argumentação, já agora adentrando o exame dos requisitos para o livramento provisório.
- DA REGRA EXPLÍCITA
DO ART. 310 DO CPP
O dispositido há também de ser sopesado para a fiel exposição do constrangimento ilegal a que se submete o paciente.
Carlos Jaime é absolutamente primário, com residência fixa e atividade laborativa, como se comnprova através dos documentos juntos ao presente (3/12).
Não estão presentes, ao contrário do que afirmado pelo Julgador a quo, os motivos ensejadores da prisão preventiva, cabendo, pois, a concessão da liberdade provisória.
ANTE O EXPOSTO, e mais o que Vossas Excelências acrescentarem aos temas, mercê dos doutos suplementos dos Membros dessa Corte, confia o impetrante seja concedida a ordem para:
a) conforme o pedido acima formulado, trancar a ação penal instaurada em face do paciente, com a concessão de liberdade provisória, mediante fiança, em, relação ao delito remanescente, devendo ocorrer em 1o Grau o compromisso e o recolhimento do valor arbitrado.
b) para a hipótese dessa Egrégia Corte entender de forma dissidente quanto ao trancamento parcial da ação penal, confia o impetrante seja concedida a liberdade provisória nos moldes do parágrafo único do art. 310, do CPP, eis que inexistem quaisquer motivos ensejadores da prisão preventiva.
RIO DE JANEIRO, 23 JANEIRO 10000003
CÉSAR TEIXEIRA DIAS
Defensor Público